domingo, 3 de maio de 2015

Autor escolhido: Susan Sontag




“Ao nos ensinar um novo código visual, as fotos modificam e ampliam nossas ideias sobre o que vale a pena olhar e sobre o que temos o direito de observar”.
Através dela, nos podemos “reter o mundo em nossa cabeça” e ter aquilo que queremos em nossas mãos, a fotografia é a “miniatura da realidade”.


Fotografo escolhido Bóris Cossoy




As imagens fotográficas não se esgotam em si mesmas, pelo contrário, elas são apenas o ponto de partida, a pista para tentarmos desvendar o passado. Elas nos mostram um fragmento selecionado da aparência das coisas, das pessoas, dps fatos, tal como foram (estética/ideologicamente) congelados num dado momento de sua existência/ocorrência. (Kossoy, 1999, p.21)








E um chaveiro com minha foto encontrado numa gaveta, deixado lá para esquecer e por um acaso visualizei-o no meu trabalho artístico.
 


 O chaveiro me insere nos locais, muito discretamente, ligando minhas recordações nos detalhes.
Para esta serie utilizei dois objetos que me remetem a uma memória afetiva:



Um tênis All Star que uso há muitos anos, sempre mudando os modelos, mas com o mesmo conceito estético. 


 

Lembranças de mim



Concepção artística

A ideia surgiu do trabalho sobre memória que me levou a revisitar lugares que frequentava há anos atrás e que hoje estão degradados ou modificados de uma forma geral. A cidade passa por grande descaso dos poderes políticos e com isso os investimentos são cada vez mais escassos contribuindo para uma quantidade enorme de ruínas. Revisitei alguns desses locais, dos quais frequentava, e optei por fotografá-los em seus detalhes, para que criasse em quem os visse uma curiosidade de onde pertencia. 


A Câmara Clara de Roland Barthes - Comentário

Muito antes das primeiras fotografias, as câmeras obscuras eram utilizadas para auxiliar o trabalho dos pintores e desenhistas. Por sua vez, câmera clara é mais um trocadilho do autor. Refere-se a câmara lúcida, um aparelho surgido no início do século XIX, que permite, através de um prisma, ver simultaneamente o objeto que se deseja representar e a folha em que será feito o desenho. O efeito ótico de sobreposição permite ao desenhista copiar com facilidade os contornos do objeto no suporte. Barthes resgata este aparato esquecido na história para dizer que a essência que encontra na fotografia não é de uma ordem profunda, íntima; ela está fora, no elemento exterior que através dela se evidencia (p.157).
        Para Barthes existe duas emoções:
      - O sujeito olhado
      - O que se olha.
        Os conceitos analíticos dizem respeito aos três diferentes pontos de vista da fotografia, sendo Operator, o operador (o fotógrafo, quem opera a câmera), Spectator, o espectador (quem vê a imagem, analisa), e o Spectrum, aquilo que foi fotografado ou o modelo que posa para a foto. Barthes é um observador que se assume ligado ás imagens escolhidas e defende que, além de falar á cultura como expressão simbólica, há algo na fotografia que toca singularmente aquele que dedica a ela um olhar.
        Studium e Punctum são dois conceitos fundamentais elaborados por Barthes nesta obra. O Studium se refere a uma leitura com critérios e objetivos definidos, algo que tem a ver com uma metodologia para a abordagem da imagem, seja ela qual for. Studium é a “aplicação de uma coisa, enfim o contexto da fotografia. Para a compreensão do studium, o spectator precisa de certa bagagem cultural, a fim de contextualizar a imagem e obter uma interpretação aprimorada. Um método que auxilia na análise da imagem e inclui este estudo do studium, é o método Cartesiano de Duvidar.
       O Punctum  é algo que parece decorrer da própria imagem, algo que  lhe toca independentemente  daquilo que seu olhar busca. Ligado ao afeto, é algo difícil de comunicar e, sobretudo de compartilhar. Despreza todo o saber e cultura, já que se trata de algo subjetivo e não referente ao contexto da imagem.Barthes cita que não se pode confundir punctum com o exagero pois o punctum sempre é um ponto na imagem que chama o olhar em particular do observador como se aquele ponto estivesse em evidência.

       A câmara clara é um trabalho de escritura que tem de saída, em suas primeiras linhas, um belíssimo questionamento: saber a qualquer custo o que era essa imagem em si mesma. Trata-se de um trabalho de pesquisa sobre o signo fotográfico ,muito mais próximo de uma estética da imagem fotográfica e que a diferencia dos outros tipos de imagens.

sexta-feira, 13 de março de 2015

Comentários sobre os filmes "La Jetée" (1962) do diretor Chris Marker e "Os 12 Macacos" (1995) do diretor Terry Gilliam.

O filme La Jetée é uma história contada através de uma sequência de fotografias fixas, fazendo saltos para o passado e futuro, como um foto-romance, juntando uma realidade em tempo real. As vezes as imagens se encaixam em sequência para compor uma cena fragmentada. Um homem marcado por uma imagem de infância. O protagonista guarda esse momento, anterior à grande guerra, pois quando criança era levado por seus pais para admirar os aviões no aeroporto de Orly. A destruição de Paris, devido à Terceira Guerra Mundial, é apresentada logo após a série de imagens no aeroporto. Os que sobreviveram estão em subterrâneos para se protegerem da radioatividade que contaminou a superfície da Terra. Em busca de uma solução para o retorno à vida na superfície, “cientistas carrascos” realizam experiências com prisioneiros, cobaias humanas, no desenvolvimento de viagens temporais em busca de uma fonte de energia para salvar a humanidade. O protagonista é escolhido, dentre os demais, por ter uma característica diferenciada: a lembrança do passado anterior à guerra. Ele viaja ao passado por diversas vezes até que conhece uma mulher e se apaixonar por ela. Ela é a mesma mulher que povoa suas lembranças de infância. Ao retornar com a missão cumprida, ele percebe que será morto pelos seus algozes. Nesse instante, ele recebe uma visita telepática das pessoas do futuro que lhe propõem viver com ele. O protagonista, porém, avista um dos seus carrascos quando era prisioneiro nos subterrâneos de Paris, sendo por ele assassinado a tiros na plataforma. Nesse instante, ele se dá conta da inflexibilidade do tempo e do destino, e entende que a lembrança que o atormentava era a cena de sua morte. 
       O que inova neste filme é a exploração proustiana do tempo, onde para o escritor Marcel Proust, no seu conhecido romance “Em busca do tempo perdido” diz que a memória involuntária é a verdadeira alavanca da redescoberta do tempo. Para Proust tempo e memória são a mesma coisa, não é apenas um período de tempo quantificável, são também sons, perfumes, etc. A memória involuntária traz o tempo em estado puro, momentos de alteração de consciência trazidos.
      O filme “Os doze Macacos” (1995) de Terry Gilliam foi baseado no filme “La Jetée”,  se inicia no futuro: por volta de 2035. No planeta Terra somente uma pequena parcela da população mundial, que vivia no fim do século XX sobreviveu à disseminação de um vírus letal. Nesse futuro, o governo é exercido por um grupo de cientistas, que desenvolveu uma máquina do tempo para que seja possível voltar ao passado (1996, quando o vírus se disseminou) e tentar obter um antídoto. Nessa missão se destaca James Cole, que volta ao passado em diferentes momentos, para cumprir esta tarefa. Cole é um homem atormentado por um pesadelo no qual ele, ainda menino nos idos de 1996, vê no saguão de um aeroporto policiais atirando e matando um homem em fuga. Esse pesadelo constitui um dos paradoxos temporais dessa narrativa que se desloca por espaços e tempos diferenciados. Considerado louco, ele termina preso no manicômio, é “resgatado” pelos cientistas e retorna ao ano de 2035, sendo submetido a um intenso interrogatório no qual tanto recebe quanto fornece informações valiosas para o cenário que os cientistas estão montando. Em um final trágico, com Cole sendo morto pela polícia diante de um Cole menino no saguão do aeroporto, a possibilidade de solução é compreensível.
      Os dois filmes ao explorarem uma vertente temporal e informacional, buscam como um projeto narrativo de ficção, elementos de referências históricas e vestígios documentais. Os pontos de aproximação entre as duas narrativas estão no âmbito do enredo ou drama: uma narrativa pessoal de lembrança e esquecimento tendo como cenário um cataclisma global. Em ambos os filmes o protagonista é prisioneiro; ambos são atormentados por uma lembrança cujo sentido só é esclarecido ao final, e cujo esclarecimento dá significado à trajetória de cada um; ambos apresentam qualidades únicas para a missão de viajar no tempo, onde nas duas narrativas, a solução está em outra temporalidade: no caso de La Jetée no futuro; em Os 12 Macacos, no passado.
       Em relação às diferenças, podemos afirmar que elas estão em estreita relação com o contexto de época: a catástrofe mundial é, na primeira produção, a Terceira Guerra Mundial; na segunda, a disseminação de um vírus altamente mortal. Cada um dos protagonistas a ser encarregado da missão é, no caso de La Jetée, a lembrança do passado, e em Os 12 Macacos, a capacidade de coletar, guardar informações e organizá-las na busca de novas. E, por fim, a solução para o futuro da humanidade está no futuro.